"NÃO EXISTE NENHUM LUGAR DE CULTO FORA DO AMOR AO PRÓXIMO"

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quarta-feira, 23 de junho de 2010

Pedras na alma




Não costumo recomendar certos livros, mas confesso que pensei em  dar dica do  Evangelho Maltrapilho* a alguém que, em forma de desabafo, detonou em e-mail pessoal, a alma do cristão atirador de pedras.  E quem não o é?! Inclusive mensagem muito bem escrita, estilo literário impecável! Embora escrever não seja nenhum mérito... Afinal, apenas escrever, ler e saber, não nos torna diferentes ou melhores dos que os que 'não são nem fazem'. Eu, particularmente, quanto mais escrevo, mais vejo o quanto somos imperfeitos e carentes do amor de Deus.

E mais: o cristão, antes de carregar esse rótulo de atirador de elite, carrega dentro de si uma natureza que não tem rótulo e que só a misericórdia de Deus o coloca em condições, digamos, aceitáveis, diante dessa horrível nueza de alma que ora se expõe. E olhe que essa capacidade em atirar pedras é apenas uma das facetas dessa alma...

Todos nós, ao longo da vida, atiramos pedras. Todos nós estamos constantemente armados delas, é só pisar no calo, no ego, na vaidade pessoal, nas dores, que elas já vão logo sendo atiradas, de imediato. E encontramos adeptos com rapidez estrondosa também! Ninguém está isento disso, é suficiente que seja um ser humano, pois é da natureza deste. Fazendo pré-julgamentos com frequência assustadora, em pensamentos e ações, uns drásticos e irreparáveis, outros nem tanto, mas capazes de provocar seus danos, TODOS NÓS, em maior ou menos escala, exercemos esse ato perverso diariamente, da hora que acordamos até a hora de dormir.

É uma estratégia quase bélica, uma luta inglória, um verdadeiro caos no nível do coração. O que atira também recebe pedras. E as guarda vingativamente para momento oportuno! E o que recebe, também o faz com a mesma maestria e perversidade. E isso é todo dia e a pedra é de todo tamanho e formato. Há uma troca diária e constante, seja sutil, velada, escancarada, silenciosa, gritante e até com o clássico beijo na face.

E quando somos envergonhados por algo e temos uma reação emocional, a tendência é nos protegermos bloqueando as emoções e deixando de percebê-las conscientemente, incapazes que somos de demonstrá-las de maneira adequada e saudável gerando um entorpecimento emocional onde todas as outras emoções agradáveis se diluem e findam por serem enterradas junto com aquelas dolorosas. Tal incapacidade tem sua origem na nossa teimosia e no nosso orgulho exacerbado que nos cega e nos impede de exercer a humildade para dar o primeiro passo, reconhecer as vaciladas e correr pra o abraço sincero e despretensioso.

Essa é a grande questão! Quem atira a pedra - e quem a recebe e se envergonha lá no mais recôndito de sua alma, porém não exterioriza, não verbaliza, não pede perdão, não consegue ZERAR e seguir feliz, PORQUE não abre mão de seu orgulho, da sua teimosia, de conceitos pré-estabelecidos, de costumes e hábitos enraizados nessa alma tão cheia de gambiarras que a tornam feia e desprezível. E essa é a nossa alma. A alma daquele que se diz cristão, do que não se diz cristão e do que julga o cristão.


Esse hábito de atirar pedras no meio da arena é perigoso e sutil posto que em cadeia e trazendo repercussões desastrosas que amarguram a alma. E, só a Graça de Deus, que não tem qualquer ligação com nenhuma igreja, nenhuma denominação e tão somente com o sacrifício feito na Cruz, é que nos encaminha a uma conduta saudável e positiva que nos permite viver em serenidade com a nossa própria consciência, livrando-nos de que se instale o azedume em nossos corações e consequentes ações maléficas.

Parafraseando o autor de Hebreus, a amargura é resultado de intensa animosidade e raiva que cria raízes amargas e que, desenvolvendo-se, produzem frutos amargos como má vontade, ira não-resolvida, ciúme, dissensão e imoralidade. Ele diz: "... Nem haja alguma raiz de amargura que, brotando, vos perturbe, e, por meio dela, muitos sejam contaminados." (Hb 12.15)

Identificar emoções e atos consequentes ( E inconsequentes), aprendendo a canalizá-las de maneira saudável, é a atitude inteligente e positiva que vai reverter esse quadro caótico. E isso só é possível quando usamos de um dispositivo chamado HUMILDADE e nos permitimos desnudar por Aquele que é o único capaz de enxergar, perdoar e lavar essa alma. Só Ele pode remover tanta sujeira num lavar definitivo que nos transforma, não em santinhos de altar ou em falso piedoso cheio de boas obras no currículo pra driblar sujeiras escondidas. Transforma-nos sim, em seres capazes de reconhecer que nada somos sem a Sua misericórdia. Tira-nos do nosso pedestal falso e arrogante. E esse lavar definitivo é maravilhoso e eficaz porque é também um lavar constante e diário por meio de um pacto onde nos surpreendemos tão feios, tão deformados, que caímos por terra e nos arrependemos pedindo perdão e cura. Pacto feito com um vaso de barro que tem a chance de se deixar ser remodelado em sangue pelo Autor desse pacto definitivo e perfeito em meio a todas as imperfeições da alma. E o nome disso é GRAÇA!

Na passagem bíblica que caracteriza a suspensão de saraivada de pedras tem algo maravilhoso, curativo, definitivo, dito por Aquele que AMA, PERDOA e ZERA nossos erros. Pois em meio  àquele frenesi doentio onde fariseus querem cumprir a lei severamente, testando a Jesus e gritando pelo castigo à mulher adúltera, ESTE vai ao cerne da questão, no âmago da alma de cada um daqueles que, envergonhados, largam suas pedras cabisbaixos e vão saindo, um por um, a começar pelos mais velhos. E para a mulher, (Que não adulterou sozinha) Ele diz, simplesmente: "... Nem eu tampouco te condeno; vai e não peques mais!"  Esse 'NÃO PEQUES MAIS' é a palavra chave. E vale para TODOS os que atiram pedras. Ou seja: para TODOS os seres que respiram e raciocinam.

E o fato de sabermos que seremos julgados por Deus, não significa cair no simplismo da frase, mas buscar viver da forma mais saudável e positiva que nos for possível, aqui mesmo nessa vida que nos foi presenteada e que é apenas um arremedo da vida eterna que Ele nos brinda.


Que a Graça e a Paz do SENHOR estejam sempre em nossos corações!

RF.



(E cá pra nós, euzinha sou muito mais essa música secular abaixo do que o lixo gospel que vendem por aí em nome de Deus.)


TUDO BEM (Lulu Santos)


Já não tenho dedos pra contar
De quantos barrancos despenquei
E quantas pedras me atiraram
Ou quantas atirei
Tanta farpa, tanta mentira
Tanta falta do que dizer
Nem sempre é "so easy" se viver


Hoje eu não consigo mais me lembrar
De quantas janelas me atirei
E quanto rastro de incompreensão eu já deixei
Tanto bons quanto maus motivos
Tantas vezes desilusão
E quase, quase nunca a vida é um balão


Mas o TEU AMOR me cura
De uma loucura qualquer
É encostar no Teu peito
E se isso for algum defeito
Por mim tudo bem... Tudo bem!


Já não tenho dedos pra contar
De quantas janelas me atirei
E quanto rastro de incompreensão eu já deixei
Tanto bons quanto maus motivos
Tantas vezes desilusão
E quase nunca, quase nunca a vida é um balão


Mas o TEU AMOR me cura
De uma loucura qualquer
É encostar no Teu peito
E se isso for algum defeito
Por mim tudo bem
Tudo bem, tudo bem

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*Evangelho Maltrapilho

(Ele é para os sobrecarregados que vivem ainda mudando o peso da mala pesada de uma mão para a outra. E para os vacilantes e de joelhos fracos, que sabem que não se bastam de forma alguma e são orgulhosos demais para aceitar a esmola da graça admirável. E para os discípulos inconsistentes e instáveis cuja azeitona vive caindo para fora da empada. E para homens e mulheres pobres, fracos e pecaminosos com falhas hereditárias e talentos limitados. E para os vasos de barro que arrastam pés de argila. E para os recurvados e contundidos que sentem que sua vida é um grave desapontamento para Deus. E para gente inteligente que sabe que é estúpida, e para discípulos honestos que admitem que são canalhas. O evangelho maltrapilho é um livro que escrevi para mim mesmo e para quem quer que tenha ficado cansado e desencorajado ao longo do Caminho. BRENNAN MANNING )

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